Qual é sua ilha?
Qual é sua ilha?
"- Infelizmente não te posso explicar agora. Mas estás errado. Assim não poderás governar a tua ilha. Um verdadeiro governador, além de sábio, precisa ter valor para vingar ofensas e castigar ofensores."
O excerto acima faz parte de
Dom Quixote, de Cervantes, encontra-se no capítulo IX onde Sancho
Pança discute com D. Quixote sobre silenciar-se em relação a um
grupo de arrieiros a que haviam estabelecido conflito por causa de
Rocinante, cavalo de Quixote, a caminho da ilha de que Sancho
buscava.
Tomando a almejada ilha de
Sancho como a individualidade e a intimidade de cada indivíduo,
podemos relacionar que assim como o acesso à uma ilha não é fácil,
ninguém deve ter livre acesso aos nossos aspectos mais íntimos e
particulares, por íntimos compreendam-se aqui não aspectos sexuais,
mas aspectos emocionais como medos, inseguranças, incertezas, nossos
pontos fracos e carências.
Por vezes nos distraímos e
deixamos com que certas pessoas adentrem a essa ilha particular,
também por vezes, diante de falsas expectativas, decepciona-mo-nos,
frustra-mo-nos com a realidade nua e crua da rejeição, seja ela por
meio de críticas ou de afastamentos cujos quais não conseguimos
explicar ou compreender, na maioria das vezes.
Afinal, o que é preciso
para que sejamos governadores de nossa intimidade?
As redes sociais estão
repletas de respostas imediatistas, portanto genéricas, relacionadas
a este assunto. Primeiramente, julga-se que para algo tão particular
e complexo como o intimismo do ser humano, bem como os desejos e
frustrações advindos dele, não podem ser respondidos com respostas
simplórias. Em segundo lugar, apropriar-mo-nos de seguranças
pessoais contra os arrieiros do cotidiano, tornam-se ferramentas
fundamentais para o resguardo de nossa saúde física e mental.
Após longo período de
autoconhecimento, podemos garantir que a conquista dessas seguranças
supracitadas ocorram através de sensações, nem sempre atreladas ao
consumo de coisas como livros, músicas, comidas, filmes, passeios etc.
Sensações estas, que recorrentemente demoram a despertar no
universo íntimo, pois é uma relação do interno com o interno.
"Vingar ofensas e
castigar ofensores" nem sempre pode estar referindo-se à
outros, talvez nosso principal ofensor sejamos nós e que nosso
castigo seja a solidão. Isso depende do que estabelecemos como
prioridades e com que gastamos nossas forças físicas e intelectuais
no dia a dia, a solidão pode ser castigo ou porto-seguro, quem
decide somos nós.
Governe sua ilha com
maestria. Vingue ofensas e castigue seus ofensores, mantendo a ilha
bem organizada e atraente para novos visitantes e quando eles
chegarem, receba-os bem, mas não revele todos seus segredos, pois
uma ilha misteriosa é muito mais interessante.
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